Lost in... Salamanca
Maio 07, 2016
a primeira coisa que fizemos ao regressar de trás-os-montes foi descarregar o trilho do GPS. fiquei desgostosa com aquele vazio ao centro. e estava desgostosa por falhar coisas básicas, como o abel e os pombais. e porque em espanha não deixei um assunto inacabado, mas sim dois..
ora o homem, que não me pode ver a remoer, começou a traçar um plano hipotético por cima do mapa.
"tens bom remédio. da próxima vez, pegas na gente e vais directa para espanha. passamos a noite algures por aqui, e no dia seguinte voltas para portugal sempre junto à barragem e vês aquilo TUDO!"
como havia fim-de-semana comprido no horizonte, eu respondi abrindo o google maps, o booking, e o tripadvisor. e foi assim que 24 horas depois do regresso, ficou logo decidida, escolhida, e marcada a desforra. com o bónus de ir conhecer uma cidade que desde há uns anos que me aguçava a curiosidade.
abril foi um reboliço tão grande que não consegui planear praticamente nada para a viagem. a sorte foi que estava marcada com um mês de antecedência, se não, acho que acabaria por nem acontecer. é um truque interessante para meter em prática.
na sexta à noite enfiamos umas tretas para dentro dum saco, e no sábado ao fim da manhã ala que se faz tarde. depois de quatro horas sem tirar o pé do acelerador, salamanca surgia finalmente no campo de visão.
há uma coisa que costumo dizer e garanto que não é mentira: não sou fã de cidades. gosto de aldeias e vilas. cidades, especialmente as movimentadas, fazem-me confusão em vários níveis.. mas existem cidades que me mandam ao tapete. aquela foi uma delas.
para começar, a localização. ao sair de portugal, pela zona montanhosa da serra da estrela, entrei num planalto magnifico, a fazer lembrar o alentejo. uma hora de condução praticamente a direito, com a vista totalmente desafogada em pano de fundo, e uma tranquilidade deliciosa. verde, e verde, e mais verde, aves de rapina a perscrutar os campos lá no alto, gado na descontra pelos imensos pastos. a cidade surgiu no meio daquele plano como um oásis no deserto.
orientei-me pelas cúpulas da catedral para ir directa ao centro. enquanto procurava um sítio onde enfiar o carro, tive o primeiro vislumbre daquilo que me esperava, e começou a baixar ali uma sensação de assombro. carro estacionado, toca a dar corda aos sapatos.
perdi-me nos contrastes.
o coração de salamanca transpira história, quase sentimos o tempo a recuar até às suas remotas origens... a quantidade quase obscena de monumentos impecavelmente conservados, convive paredes meias com edifícios mais modernos, mas que nem por isso destoam. é que para além do notável esforço em manter o estilo pitoresco, e preservar o encanto romântico das fachadas, existe um elemento-chave que liga aquele cenário todo - a cor dourada da pedra utilizada nas construções.
não só ofusca as diferenças entre os edifícios antigos e os novos, como por ser uma cor quente, transmite uma sensação invulgarmente acolhedora. apetece mesmo perder-nos por aquelas ruas e ruelas todas, e não é apenas pela beleza dos edifícios.
alguns detalhes surpreendentes: não há cá painéis a descaracterizar as fachadas, os letreiros são escritos a tinha vermelha na pedra; as placas dos números de polícia serem idênticas em todo o centro; e a decoração dos suportes das caleiras.
pode ser uma cidade muito antiga, esforçar-se por manter um ar quase medieval, mas não tem um feel antigo. a razão é simples: sendo um enorme polo universitário, está tomada de assalto por milhares de estudantes. há gente jovem por onde quer que se aponte os olhos, a curtir a cidade nos tempos livres. a juntar às hordas de turistas, é uma mistura que resulta num ambiente muito animado e descontraído.
durante a tarde, à medida que as nuvens cinzentas se iam afastando, as ruas iam enchendo cada vez mais. nas zonas mais concorridas chegava a ser difícil andar sem andar a encalhar em alguém. ainda assim, a cidade permanecia limpa, e não havia qualquer vestígio de insegurança.
andamos, andamos, e andamos. tentando evitar ao máximo passar duas vezes no mesmo sítio. a cada passo que dava, a cada esquina que contornava, abria-se um mundo novo. sempre com qualquer coisa de fantástico para admirar. duas coisas que eu não conseguia fazer: tirar os olhos de cima e o queixo de baixo. três, se juntar o facto de não conseguir tirar o dedo de cima do disparador da máquina.. de fazer um turista japonês corar de vergonha LOL
para lá do passeo de san vicente e da gran vía, surgia uma cidade absolutamente normal, com outro tipo de movimento, trânsito, e muito menos concorrida pelos turistas.
só paramos quase às oito e meia, e foi porque tínhamos uma reserva num restaurante longe do centro.
uma coisa que aprendi neste salto a espanha, janta-se tarde por lá. quando fiz a reserva, não me ocorreu que às oito e meia, o sol ainda vai alto e era capaz de ser cedo para cenar. parece que só lá prás dez é que eles começam a pensar no assunto. also, explica porque é que há uns anos atrás, a minha reserva no restaurante em madrid ficou sem problemas para as dez e meia, e às onze ainda havia gente à espera de mesa. hum.. agora por isso, será que fui espanhola na minha vida anterior? é que o meu ritmo circadiano está muito melhor ajustado aos horários deles que aos nossos :D
do restaurante fomos directos para o hotel, comigo a lamuriar por não ir dar umas voltinhas noturnas pela cidade. mas estávamos cansados, e o dia seguinte ia ser igualmente cansativo. era melhor não arriscar, que uma pessoa já não vai para nova.
claro que passei as duas horas seguintes a engendrar um regresso mais demorado. e depois voltei a atenção para a tv, que estava a passar o alien (o manhoso) dobrado em espanhol muhahaha
álbum completo aqui