foi no dia 3 de janeiro, ainda muita gente andava a curar a ressaca da passagem de ano, que tive a primeira demonstração da bosta que este ano ia ser.
regressávamos do trabalho, quase, quaaase a chegar a casa. trazíamos um colega connosco, a quem damos boleia com muita frequência. também é daquelas almas que fica até às tantas no escritório, e acabamos por sair quase sempre juntos. como ele vem para os nossos lados, é um pequeno desvio que não nos importamos de fazer.
parei numa fila de trânsito, que desde há vários meses se gerava naquela zona, por causa dumas obras de santa engrácia, que nunca mais tinham fim. o homem e o colega conversavam animadamente, eu estava atenta ao fluxo do trânsito, mentalmente a esfregar as mãos por estar prestes a enfiar-me no pijama e passar o resto da noite a vegetar no sofá, quando a sensação mais surreal da minha vida acontece.
não é fácil meter aquele filme por palavras.. num momento estava tudo na maior das descontracções, noutro somos atravessados por uma força esmagadora, acompanhada dum estrondo ensurdecedor. lembro-me de ter sido projectada para a frente, de ser violentamente travada pelo cinto de segurança, e de não conseguir respirar durante vários segundos. os músculos devem-se ter contraído todos ao mesmo tempo, que corpo ficou tão rígido que era doloroso.
desorientada, olho para o homem, que estava em total estado a pânico, a perguntar o que tinha acontecido. estávamos os três completamente atordoados.. ninguém se apercebeu o que tinha acabado de acontecer, até que um de nós teve a clareza de notar que tínhamos tido um acidente.
nisto, apareceu-me uma pessoa ao lado, a bater no vidro. eu, cheia de tonturas, mais para lá do que para cá, baixo o vidro a ver o que ela quer. pergunta se estamos bem, e diz-me que lhe bati.
"bati?" oi.. como é que isso é possível? sempre que paro atrás de alguém na estrada, costumo deixar a uma distância generosa, tipo 2 ou 3 metros.. diz-me ainda que tentou arrancar mas que não foi a tempo. e eu ainda tava presa na primeira parte, "a sério que bati?" jura?
assim à vista desarmada, não tinha ferimentos, mas comecei a sentir uma dor intensa nos gémeos, e se já estava a ver tudo a andar à roda, senti-me a perder as forças, como quem vai desmaiar. o colega diz que é melhor sairmos do carro, não vá haver combustível espalhado e o cenário incendiar-se. saltamos os três para fora do carro como se tivesse transformado em lava naquele momento.
quando saí fora do carro e vi que tinha um camião porta-contentores enfiado na traseira do meu carro, pensei em voz alta "FODA-SE..... como é que estamos vivos, caralho??"
PUTA!
QUE!
PARIU!
se podia ter sido só um "beijinho", chapa amolgada e uns plásticos rachados, que o carro é tão alto que o outro nem aos faróis traseiros lhe chegava, podia.. mas não era a mesmo coisa... até porque pelos vistos, comigo as coisas nunca acontecem por menos. só levamos com algumas 15 toneladas pelas costas 😐
a traseira do carro simplesmente desapareceu. não sei como é que o colega que ia atrás não ficou feito num oito.. aliás, se calhar até sei, não tinha o cinto posto e vinha agarrado aos dois bancos da frente, porque se tivesse preso ao banco de trás, se calhar o resultado tinha sido outro.. mas que o habitáculo aguentou a colisão incrivelmente bem, não restam duvidas.
e de facto a matricula dianteira (a traseira estava dentro das entranhas do camião) estava rachada, por isso sim - bati no carro da frente. sabe lá o senhor que está no céu durante quantos metros fui arrastada com o embate.
[ele há coisas do demo.. por estas alturas, era para estar a publicar um post sobre o primeiro aniversário do meu bólide azul florescente, e o quanto gosto dele.. e em vez disso, tou a relatar o seu falecimento.. ]
o fulano que nos passou a ferro estava completamente - e quando digo completamente, digo COMPLETAMENTE histérico! parecia uma barata tonta, de um lado pro outro, numa estada de 3 faixas, com carros a passar de ambos dos lados, a berrar a sua triste sina aos deuses (porque aparentemente não foi a primeira vez que aquilo lhe aconteceu). amigue, se há aqui alguém que deva estar fodido com o universo, se calhar sou eu, não??
sempre imaginei que, no dia em que isto me acontecesse, ia sair do carro, a espumar-me toda de raiva e a gritar histericamente com a besta que me bateu, a chamar-lhe todos os nomes e mais alguns.. mas não.. estava perfeitamente calma.. zen quase!
ainda não havia seis meses que tinha o carro, mas estava zen. podia ter morrido ou ter ficado gravemente ferida, mas estava zen.. estava mazéra em choque, só podia!
bom, e agora? mékie? chamar a policia, chamar o reboque, assinar participações.. nisto passa por nós, uma das melhores pessoas que tenho na minha vida, que ao reparar no desgraçado do carro que tinha sido enrabado pelo camião, parou ali e ficou comigo até aquela provação acabar, ajudando naquilo que conseguia ❤️
não sei como, mas conseguimos sacar a tralha toda que tínhamos na mala - tipo, a mochila do homem com o portátil lá dentro, mais a minha mochila com os headphones novos, casacos, entre outras cenas, sem um arranhão.
entretanto o homem e o colega seguiram para o hospital ali perto. já eu, passei quase 3 horas ao frio e cheia de dores, a ter que tratar daquela cangalhada toda com a polícia e o reboque. o tipo do reboque, veio confirmar a quilometragem do carro comigo, não queria acreditar que ainda só tinha 7 mil km.. olha, somos dois!
duas faixas fechadas.. um trânsito medonho.. policia.. bombeiros.. reboques.. ca'puta de confusão..
no hospital, reparei que tinha um hematoma e uma raspadela na testa. olha que giro, não me lembro de ter batido com a cabeça em lado algum.. e por acaso até nem me estava a doer a cabeça. doía-me a cervical, a lombar, o peito, os gémeos das pernas, e a alma. a cabeça não. fiz TAC e tava tudo normal, assim como os vários RXs que fiz às outras partes. o médico que me atendeu era um porreiro, tantas PPMs (piadas por minuto) caneco!
cheguei a casa, enfiei-me finalmente no pijama e aterrei no sofá. era mais ou menos assim que tinha planeado acabar aquela noite.. excepto que mais cedo, sem o corpo todo dolorido, e com o carro na garagem..
tanto eu como o homem ficamos com dores horrorosas nos gémeos (ele custava a andar), que dias depois se transformaram em hematomas gigantes. já o colega não se queixou das pernas.. não percebíamos o motivo disto, até que me meti a ver vídeos de crash tests e descobri: levamos com o ferro de ajuste da posição do banco. ouch!
por três vezes já tive muito perto de bater a bota. quando levei com o taco de basebol na cara, uns centímetros mais a cima e não sei se estava cá hoje... quando estava prestes a me afogar numa praia deserta, se não fosse a minha irmã ter conseguido safar-se e ter-me jogado a mão.. e naquele dia, se o fulano tivesse demorado mais uns segundos a aperceber-se que o trânsito estava parado, e me tivesse batido com mais velocidade. é uma sensação de merda, quando nos apercebemos o quão fácil é ir desta para melhor, não recomendo.
...e a puta da burocracia para resolver um imbróglio destes? ZOMG!!
depois.. covid cenas, tudo aterrado, serviços administrativos estatais (e não só) que em plena pandemia não aceitam documentos nem assinaturas digitais, e foi preciso esperar por cartas, imprimir documentos para assinar, demoras para cá, demoras para lá, só em junho é que dei esta salganhada finalmente por terminada.
a minha seguradora portou-se TÃO MAL, mas TÃO MAL, que jurei nunca mais fazer seguro algum com eles. e adivinhem em qual é que fiz o seguro novo? na do culpado (como era para ter sido logo desde o inicio) lol!
mas nem tudo é mau, vá! carro novo, modelo actualizado de fresco, com umas melhorias bastante simpáticas. embora ainda tivesse que largar uns euros valentes para cobrir a diferença entre a indemnização da seguradora e o valor ligeiramente mais alto do carro. mas nota 20 para o pessoal da toyota, foram impecáveis, esperei menos de duas semanas pelo carro e consegui negociar as mesmas condições de crédito que tinha.
cabrão do universo, que não me deixou chegar aos 20 anos de encartada sem um acidente no cadastro 😡